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A desculpa é ter verbas para turbinar o Bolsa Família
Bancos serão beneficiados
Por Almir Cezar Filho*
O governo federal enviou ao Congresso Nacional, nesta segunda-feira (9), uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permitirá o parcelamento no pagamento de precatórios a partir de 2022. A proposta surge junto com o projeto que altera o Bolsa Família, de assistência às famílias de baixa renda. Porém parte desses recursos economizados com o calote acabarão no setor financeiro.
A Medida Provisória que cria o Auxílio Brasil não informa o seu custo total. No anúncio, o ministro da Cidadania, João Roma, afirmou o aumento do número de famílias beneficiadas. O valor deve ser de, no mínimo, 50% a mais, mas não detalhou números. Considerando que hoje o benefício médio é de R$ 189, o novo valor ficaria em R$ 283,50 – abaixo dos R$ 300 prometidos pelo presidente.
Para não furar a regra do teto de gasto, criado no governo Temer, e seguido à risca, o governo Bolsonaro pretende dar um calote nos detentores de precatórios, dívida reconhecida pela Justiça em última instância, e cujos valores devem constar no Orçamento da União.
Durante o anúncio, o governo ainda afirmou que obterá R$ 33,5 bilhões com o calote nos precatórios. Não pagar o valor devido no prazo previsto é tido como uma “pedalada” com fins eleitorais.
Precatórios são dívidas da União com pessoas físicas, jurídicas, estados e municípios reconhecidas em decisões judiciais definitivas, ou seja, que não são mais passíveis de recursos e que devem ser pagas pelo governo.
A prorrogação do prazo de quitação destas dívidas é uma de forma de preservar o recurso nos cofres públicos. O argumento é de que isso reforçaria as medidas de combate aos efeitos da pandemia da Covid-19 e geraria o alívio fiscal para turbinar o Bolsa Família por meio do novo Auxílio Brasil.
Ao longo do ano passado, o Judiciário já tinha autorizado a suspensão do pagamento de precatórios pelos Estados para garantir recursos ao enfrentamento da pandemia do novo coronavírus e queda da arrecadação.
A Constituição Federal, por força da Emenda Constitucional 99/2017, determina que os governos estaduais destinem 1,5% da receita para o pagamento dessas dívidas. Os municípios devem destinar 1%. Os municípios têm uma dívida de R$ 40 bilhões com precatórios.
Ocorre que a iniciativa levará um grande prejuízo, principalmente para os idosos, justamente o grupo de cidadãos que mais deve ser protegido neste momento. As pessoas que aguardam por estes pagamentos poderiam tratar da sua saúde, comprar eletrodomésticos, reformar suas casas, adquirir um imóvel. Enfim, usar este recurso conforme suas necessidades.
E os municípios não teríamos mais que enfrentar os sequestros (de bens) das contas municipais que atingem, inclusive, recursos da Saúde. Valores que estão lá para serem usados com transporte escolar e merenda e que são sequestrados (com ordem judicial) para o pagamento de precatórios.
A Emenda Constitucional aprovada há três anos, a EC nº 99/2017, estabeleceu que, no prazo de seis meses, a União deveria passar a oferecer linha de crédito para ajudar os municípios a quitarem seus títulos precatórios.
E não é dinheiro do Orçamento. A União não colocaria nada (nenhum centavo). Só provocaria a Caixa, o Banco do Brasil e instituições privadas, a colocarem linhas de crédito à disposição (das prefeituras) para fazer frente a esta situação. Contudo não é feito assim.
Atualmente, as pessoas credoras de precatórios são obrigadas alternativamente a descontá-los junto aos bancos, com forte deságio (redução no valor de face). É um mecanismo muito similar à antecipação do 13º ou da restituição do imposto de renda, mas ainda mais desfavorável aos clientes. O sistema financeiro aguarda este adiamento pelo governo para lucrar ainda mais por meio disso. Depois os bancos ainda poderão usar os precatórios pelo valor de face como moeda em privatizações.
A proposta de economia com suspensão do pagamento de precatórios é maior do que o valor previsto ao novo programa. O Judiciário encaminhou ao governo uma previsão de despesas de R$ 90 bilhões com precatórios. E o Governo disse que economizaria R$ 33,5 bilhões para usar no Auxílio Brasil.
Apesar de não anunciado o destino dos recursos excedentes, provavelmente, serão usados em outras ações de cunho eleitoral, para inauguração de obras em redutos e repasses às emendas parlamentares.
Outra opção, ainda mais grave embora também não anunciada, seria dirigir os recursos aos pagamento da dívida pública junto aos bancos, que pressionam o bolo do orçamento. O Ministro da Economia, Paulo Guedes discursa com frequência que qualquer recurso a mais do Tesouro, inclusive de privatizações, deveria servir para abater a dívida pública.
A MP prevê que os beneficiários do Auxílio Brasil poderão comprometer até 30% do valor do benefício como garantia para operações de microcrédito como empréstimo consignado junto a bancos e financeiras.
Em resumo, o conjunto do projeto de calote dos precatórios, de um jeito ou de outro, beneficiará Bolsonaro e Guedes e, em muito, o setor financeiro. Com pouco ou nenhum ganho para os trabalhadores.
(*) Almir Cezar Filho é apresentador do programa ECONOMIA É FÁCIL na
Web Rádio Censura Livre. Inédito e ao vivo toda quinta-feira, às 20h.